"O Ciberespaço

e a Dinâmica do Conhecimento"

Bruno Saiter Zorzal

Graduando do curso de Comunicação Social

da Universidade Federal do Espírito Santo

(artigo preparado a partir do trabalho de iniciação científica)

 

 

 

 

 

Introdução

A partir do início dos anos 80, o crescimento nas vendas dos microcomputadores domésticos supera o dos microcomputadores profissionais. O computador passa a ser visto de forma mais amigável. Passa a ser um instrumento de geração e transmissão de informação, assim, atuando muito mais na vida do cidadão comum, na sociedade.

Hoje em dia o computador não é mais objeto de respeito e de assombro, mas tende muito mais a assumir o lugar de instrumento útil de todos os dias, desde o local de trabalho até os momentos de lazer. No rápido decorrer de poucos anos, ele alterou profundamente as formas de comunicação e transformou todos os tipos de informação, com uma capacidade difusora que os seus próprios idealizadores não poderia sequer imaginar a apenas 30 anos (Giovannini, 1987)

O tema desse trabalho é o ciberespaço e suas implicações na produção do conhecimento. Mas o que é ciberespaço?

Encontramos um conceito de ciberespaço com Santaella (1996: 206), que diz que este é "... um espaço sintético no qual um ser humano equipado com hardware apropriado pode atuar, tendo por base um feedback visual, acústico, e mesmo tátil obtido de um software." Assim, uma pessoa atua no ciberespaço a partir do momento em que se senta na frente de um computador programado adequadamente.

Podemos citar um exemplo de ciberespaço: hipertexto, World Wide Web - W.W.W., vídeo game, realidade virtual, groupware e conferência eletrônica. Todos possíveis graças às transformações ocorridas tanto no campo da informática quando nas telecomunicações, que passaram textos, dados, gráficos, som e imagem para o formato digital.

O exemplo mais marcante deste espaço, onde encontramos convergência de mídias e fluxo de informação crescente, é a Internet. Mas vale ressaltar que este ambiente ainda se encontra em formação e esbarra em várias dúvidas sobre o seu futuro, como se vai contribuir para aumentar a distância que existe entre quem possui a Internet e quem não a possui.

Diante de todo um contexto criado pela informática contemporânea, surge um novo espaço de conhecimento, o ciberespaço, onde duas grandes propriedades são: a criação de saberes por navegação e aprendizagem colaborativa.

Iniciando por alguns pré-supostos básicos para se entender a rede da forma em que foi utilizada como objeto de estudo, iremos desenvolver um pouco do que pode ser visto e entendido como uma nova mídia que engloba informações e os dispõe às pessoas para utilização, retransmissão, comunhão, multiplicando infinitamente o conhecimento numa escala ainda nunca experimentada.

Primeira parte

O ser humano, há séculos, busca formas de preservar os conhecimentos e informações para as gerações posteriores. Na Antigüidade grega, o que predominava era a oratória, a fala. Walter Ong (1998) lembra que enquanto a história do homem moderno (Homo sapiens) abrange dezenas de milhares de anos, a invenção da escrita alfabética não chega a três mil anos.

Dessa forma a oralidade foi por quase a toda a história humana a principal tecnologia intelectual utilizada para o processo de transmissão do pensamento. Sem a escrita, a educação das pessoas se faz por via prática e os conhecimentos são transmitidos através das gerações pela fala. A distância entre aquele que ensina algo e aquele que aprende é a distância do alcance do som da voz. Além disso, ao contrário da escrita, a fala já está profundamente incorporada ao homem, por isso pode ser tão cedo aprendida pelas crianças, apesar de sua complexidade.

Ao contrário, o uso do suporte escrito demanda um complexo conjunto de técnicas, em contrapartida à fala, menos intrínseca ao homem. Atualmente o uso da técnica e sua importância se difundiu infinitamente a ponto de abranger, com seu desenvolvimento científico, todas as esferas sociais.

Nas sociedades orais, as mensagens lingüísticas eram sempre recebidas no tempo e lugar em que eram emitidas. Emissores e receptores compartilhavam uma situação idêntica, um universo idêntico de significação. Com a invenção da escrita, o processo se torna exterior ao local e tempo em que o fato se deu, isto é, "os textos se separam do contexto vivo em que foram produzidos." (Lévy, 1999: 15)

Universal não totalizante

A escrita abriu um espaço de comunicação desconhecido pelas sociedades orais no qual tornava-se possível tomar contato com mensagens produzidas há milhares de quilômetros ou então escritas há séculos, ou até mesmo que compartilhava de diferentes culturas - nesse caso claro que subsidiada por uma contextualização já interiorizada pela cultura para ser compreendida pelos receptores, que são as traduções, interpretações e toda uma tecnologia lingüística (dicionários, gramáticas, etc).

Todo esse esforço para fazer com que mensagens circulem até mesmo fora do seu contexto de produção corresponde a idéias do universal. "Subsistindo fora de suas condições de emissão e recepção, as mensagens escritas mantém-se ‘fora de contexto’. Esse fora de contexto " (...) foi legitimado, sublinhado, interiorizado pela cultura. Irá tornar-se o centro de determinada racionalidade e levará, finalmente, a noção de universalidade." (Lévy, 1999: 114). A partir daí, as mensagens se tornam auto-suficientes, auto-explicativas, abrangendo suas próprias razões, que não teria pertinência numa sociedade oral.

Desde a passagem da sociedade oral para a escrita, há uma constante busca pela reunião de todos os conhecimentos transformando-os em textos impressos que com o advento do ciberespaço tornou-se um universal, porém, sem totalidade. Esse é o principal evento cultural animado pela emergência do ciberespaço: a desconexão desses dois tipos de "operadores sociais" que são o universal e a totalização.

Pode-se explicar tal preposição citando Lévy: "O ciberespaço dissolve a pragmática da comunicação que, desde a invenção da escrita, havia reunido a universal e a totalidade. Ele nos leva, de fato, à situação existente antes da escrita - mas em outra escala e em outra ordem - na medida em que a interconexão e o dinamismo em tempo real das memórias on-line tornam novamente possível, para os parceiros da comunicação, compartilhar o mesmo contexto, o mesmo imenso hipertexto vivo." Qualquer que seja a mensagem abordada, encontra-se conectada com outras mensagens e por conseqüência a pessoas que se interessam por elas e a comentários feitos sobre ela no momento em que se lê. Seja qual for o texto imerso no ciberespaço ele é apenas um fragmento do hipertexto que o envolve e o conecta a outros textos por "links".

Hoje, com a evolução constante causada pela imensa inserção de textos e a colocação em rede de um número cada vez maior de máquinas quase não há mais mensagens "fora de contexto", separada de uma comunidade ativa. "Virtualmente, todas as mensagens encontram-se mergulhadas em um banho comunicacional fervilhante de vida, incluindo as próprias pessoas, do qual o ciberespaço surge, progressivamente, como o coração." (Lévy, 1999: 118)

A partir da passagem anterior pode-se chegar a duas premissas básicas em relação ao próprio contexto virtual das redes. Uma é o ciberespaço surgindo como centro agregador de milhares de informações e também de pessoas interessadas nessas informações contidas em um espaço de interconexão aberta, movido por comunidades virtuais formadoras de uma inteligência coletiva.

Outra conclusão é que o ciberespaço surge buscando uma "interconexão generalizada", que é o motor primário do crescimento da internet. Emerge como uma forma de universal diferentemente da escrita estática, onde é necessária toda uma contextualização - através de traduções, interpretações e mecanismos já citados anteriormente - para que a obra seja lida e compreendida fora do contexto onde fora produzida e onde a obra era entendida pelo sentido, pois ao lermos, por exemplo, um livro traduzido de qualquer que seja a língua, não estamos lendo o que o autor escreveu, estamos tomando contato sim com o sentido que o autor quis dar à obra. O sentido é o mesmo, a obra não.

No universo virtual, "Esse universal não totaliza mais pelo sentido, ele conecta pelo contato, pela interação geral." (Lévy, 1999)

Por meio dos computadores e das redes, as pessoas mais diversas podem entrar em contato, trocar informações e experiências. Portanto, o novo universal ao invés de ser construído com base na identidade do sentido, realiza-se por imersão já que o contato se dá em tempo real de todos com todos. "Os meios eletrônicos de comunicação contraem o mundo, reduzindo-o à proporção duma aldeia ou tribo (...): todos estão a par de tudo o que está acontecendo, no momento mesmo do acontecimento" (Mcluhan, 1980).

Segundo Roy Ascott (citado por Lévy, 1999: 13) o que estamos vivendo é um "segundo dilúvio", o das informações:

As telecomunicações geram esse novo dilúvio por conta da natureza exponencial, explosiva e caótica de seu crescimento. A quantidade bruta de dados disponíveis se multiplica e se acelera. A densidade dos links entre as informações aumenta vertiginosamente nos bancos de dados, nos hipertextos e nas redes. Os contatos transversais entre os indivíduos proliferam de forma anárquica.(Ascott apud Lévy, 1999: 13)

 

O conhecimento e seus instrumentos

Mas toda essa quantidade de informações a que somos expostos em nossas vidas depende de linguagens e sistemas de representação para poder percorrer cada espaço e atingir uma quantidade de indivíduos cada vez maior. Não seria possível imaginar o homem sem tais artifícios de expansão da capacidade mental.

O ser humano pensante constitui-se de tais linguagens e sistemas de representação, que irão estruturar sua experiência e sua vida. Para isso, ele dispõe de instrumentos de organização e registro de memória e propagação de informação e de complexos dispositivos produtores de linguagem. Pode-se dizer, inclusive, que a própria evolução humana é marcada pelo desenvolvimento da linguagem como tecnologia intelectual. A esse respeito cabe citar Santaella (1996: 165):

... entre a evolução privilegiada do sistema nervoso central do homem e a performance que lhe é específica, a linguagem simbólica, deve ter havido um ajustamento estreito de modo a tornar a linguagem não tão só o produto, mas uma das condições iniciais dessa evolução. (...) Contudo, não há nada no animal que se assemelhe à maquinaria combinatória dos fonemas que regem a complexidade de organização das línguas humanas, nem há, em qualquer animal a capacidade projetiva e simuladora do cérebro apta para estabelecer novas combinações e associações criadoras que, aliadas às sutilezas da mão e do corpo, permitem ao homem produzir linguagens para fora do corpo e do cérebro, isto é, povoar o mundo dos signos.

O ser humano tem transferido para os suportes externos, fora do seu próprio corpo, a capacidade de produzir linguagens. A memória, para ser gravada e armazenada, demanda certos espaços de registro, tal como o pergaminho, o papel, o livro, as bibliotecas ou as máquinas informáticas contemporâneas.

As criações de novos dispositivos para o armazenamento e a circulação de informação marcam etapas importantes na aventura humana e desempenham um papel significante nos processos cognitivos. Segundo Lévy, (1993: 160) "as tecnologias intelectuais desempenham um papel fundamental nos processos cognitivos, mesmo nos mais cotidianos; para perceber isso, basta pensar no lugar ocupado pela escrita nas sociedades desenvolvidas contemporâneas."

Registro

As técnicas de registro de circulação são importantes, porque nos permitem trabalhar com eventos e coisas ausentes no tempo e no espaço, ou eventos e coisas que nunca existiram - objetos imaginários e conceitos.

... graças à linguagem, temos acesso "direto" ao passado sob a forma de uma imensa coleção de lembranças datadas de narrativas interiores. (...) Quanto mais as linguagens se enriquecem e se estendem, maiores são as possibilidades de simular, imaginar, fazer imaginar um alhures ou uma alteridade. (Lévy, 1996: 72-73)

Pela primeira vez os discursos podem ser separados das situações particulares em que estavam inseridos, isto é, o receptor não necessariamente precisa compartilhar o mesmo contexto do emissor. Na sociedade oral, por exemplo, quando não se dispunha de técnicas de armazenamento exterior, os registros estavam na memória e eram compartilhados no mesmo contexto, tanto espacial e temporal quanto semântico.

O casamento da informática com as telecomunicações, a telemática, segundo Dowbor (1994), torna possível criar e partilhar conhecimento em grande volume e rapidez. Isto implica na ampliação da possibilidade de alcance cognitivo humano, pois ele pode alcançar conhecimento espacialmente distante, de forma quase instantânea. Dowbor completa: "O fato essencial é que podemos transformar em sinais magnéticos, qualquer informação sob forma de som, de escrita ou de imagem fixa ou animada. Uma vez que esse processo é dominado, em grande escala, com grande rapidez e de forma barata, a maleabilidade dos conhecimentos é profundamente revolucionada." (Dowbor, 1994: 120-121) Estamos entrando num circuito em que o conhecimento bate à sua porta, não mais limitado pelo espaço geográfico, mas compondo um espaço virtual.

Suporte

Portanto o que seria a mente sem linguagem e sem instrumentos? O que é a mente sem a conversação, sem a presença do social e de todos os aparelhos de registro ou de memória? A memória humana sempre se valeu de recursos externos para expandir sua capacidade de retenção de informações e lembranças. Vários suportes têm sido utilizados, desde as eras mais remotas, para preservar recordações de acontecimentos marcantes. Inscrições e desenhos nas paredes, areia, papiros e arquivos, pinturas, quadros, agendas, cadernos.

A mente humana está em constante diálogo com a tecnologia e a cultura. E o pensamento demanda o registro de raciocínios parciais para, a partir dele, poder evoluir para trás e para frente. A reflexão requer o auxílio de suportes extracorpóreos.

A máquina computacional como linguagem e suporte

Estando separado do processamento de dados e do setor de produção das grandes empresas, o computador tornou-se um instrumento de criação de textos, de imagens, de música, de organização banco de dados, planilhas, de simulação (planilhas, ferramentas de apoio à decisão, programas para pesquisa) e de diversão (jogos) nas mãos de uma proporção crescente da população dos países desenvolvidos.

No fim dos anos oitenta e no início dos anos noventa, um novo movimento sócio cultural que se originou sem que nenhuma instância dirigisse esse processo juntou as diferentes redes de computadores, que se formaram desde o início dos anos setenta, umas às outras, enquanto o número de pessoas e de computadores conectados a esta nova rede começou a crescer de forma exponencial.

Como no caso da invenção do computador pessoal, uma corrente cultural espontânea e imprevisível impõe um novo curso ao desenvolvimento tecno-econômico. As tecnologias digitais surgiram, então, como a infra-estrutura do ciberespaço, novo espaço de comunicação, de sociabilidade, de organização e de transação, mas também novo mercado da informação e do conhecimento. (Lévy, 1999)

Novo meio esse que é criado pela soma dos equipamentos (hardware e software) integrando uma rede não mais centrada na máquina, mas nas informações circulantes nas máquinas formadoras do ciberespaço. Foi o momento em que o computador passa de um objeto isolado para a forma de um conjunto técnico.

Segunda Parte

O ciberespaço como soma das máquinas

Teríamos somente uma visão parcial da virtualização contemporânea do texto e da leitura se focalizássemos unicamente na passagem à tela do computador. O computador com o suporte de mensagens potenciais já se integrou e quase se dissolveu no ciberespaço.(Lévy, 1996: 16)

Na passagem, Lévy trata da virtualização do próprio computador, na abordagem de desterritorialização da máquina, pois na atualidade, quando se trata da palavra computador, o relacionamento é feito não mais a uma máquina de cálculos e aceleração de processos, e sim ao conceito de ciberespaço e internet, espaços virtuais criados por uma gama de máquinas ligadas a uma rede de comunicação navegável. E completa:

Durante muito tempo polarizado pela ‘máquina’, balcanizada até recentemente pelos programas, a informática contemporânea traz software e hardware - desconstrói o computador para dar lugar a um espaço de comunicação navegável e transparente centrado nos fluxos de informação. (Lévy, 1999:44)

Um computador conectado ao ciberespaço pode recorrer à capacidade de memória e de cálculo de outros computadores da rede e também a diversos aparelhos de exibição de informação. Sendo assim, o computador pode ser percebido não mais como um centro, e sim um nó, um componente da rede.

No limite, há apenas um único computador, um único suporte para texto, mas tornou-se impossível traçar seus limites, fixar seu contorno. É um computador cujo centro está em toda parte e a circunferência em nenhuma, um computador hipertextual, disperso, inacabado, virtual: o próprio ciberespaço. (Lévy, 1996: 47)

Sobre o entendimento e percepção do mundo virtual tal como proposto discorre Guattari:

... para estabelecermos essa ponte, temos que nos desfazer de visões mecanicistas da máquina e promover uma concepção que englobe, ao mesmo tempo, seus aspectos tecnológicos, biológicos, informáticos, sociais, teóricos, estéticos (...) de modo que o imenso encaixe de máquinas em que consiste o mundo hoje, se acha em posição autofundadora de sua passagem ao ser. O ser não precede a essência maquínica; o processo precede a heterogênese do ser. (Guattari, 1992: 136-8)

A soma das partes

O ponto de guinada histórica da relação com o saber, segundo Lévy (1999), dá-se no final do século XVIII, quando Diderot e d’Alambert publicaram sua Encyclopédie. Até então afirmavam ter reunido e totalizado os conhecimentos - pelo menos os mais significativos e importantes - num documento que um pequeno grupo de homens supunham ser o todo e podiam afirmar que dominavam o saber em sua totalidade.

A partir do século XX, o mundo passando a ter suas fronteiras expandidas e distâncias encurtadas, fazendo com que o desenvolvimento científico e técnico se expandisse. Com a constatação da diversidade existente no mundo, o domínio da totalidade dos saberes passou a ser ilusório aos indivíduos. Hoje se tem concretizado a idéia do intotalizável se tratarmos da reunião do conhecimento.

Mesmo na Web - um meio digital e infinitamente mais maleável e completo que qualquer meio de documentação por se tratar do meio digital - a totalidade se perde. O desenvolvimento dessa linguagem não significa que o "todo" pode ser acessado. Ao contrário, o todo está definitivamente fora de alcance se encararmos unicamente o modo de reunir numa só leva, tudo.

Por outro lado, cada indivíduo pode construir e reunir à sua maneira tudo aquilo que lhe tem significado ou causa interesse dentro desse imenso banho informacional a que está sujeito o mundo de hoje. Desse modo, o todo se torna relativo se for levado em consideração o fato de não se chegar a uma unidade total unindo tudo num só barco mas sim, somando os pequenos e parciais mundos de significados inerentes a cada sujeito componente do mundo informacional. Todos contribuem, mesmo que indiretamente para a proliferação e reunião de diversos pontos de vista, hoje possível com o mundo digital que se torna a cada dia mais acessível a uma grande quantidade de consumidores por conta, principalmente, do desenvolvimento e conseqüente barateamento de equipamentos informacionais.

Viagem em Intensidade - uma possível conclusão

O professor Pinho Neto (1997) traça um quadro inverso à velocidade física como a conhecemos e a transpõe para o interior da sociedade, aplicando-a aos homens modernos com suas máquinas velozes capazes de colocar o "mundo" à sua disposição todos os dias, com suas milhares de informações criadas e divulgadas no decorrer do tempo em que ele se insere.

O autor contrapõe velocidade e intensidade no qual afirma que deixamos de lado a primeira em detrimento da segunda. Participamos duma "viagem não em extensão mas em intensidade". Intensidade essa, compositora e formadora de híbridos e, usando Latour em sua proposição que diz existir uma hibridização entre economia, ciência, religião, técnica, direito, política, contrariando o projeto moderno onde a "ciência tinha como meta a purificação, a supressão das opacidades, dos mitos que impediam os homens de conhecer a razão fundadora e organizadora de todas as coisas". Afirma também, com isso, não haver mais espaços para essências e sim bricolagens, redes, contágios, misturas.

Segundo o autor, apesar de aparentemente a sociedade estar tão veloz, essa velocidade não pode ser traduzida em movimento, mas sim em intensidade. É o "tempo

da rede" proporcionado pelo desenvolvimento tecnológico. Essa intensidade não sugere um movimento físico mas um fluxo intensamente absurdo proporcionado pela virtualização da informação (imagens, sons, textos, gráficos, simulações) que circulam pelo globo perpassando indivíduos e sensibilizando-os cada qual de um modo.

Essa vertiginosa quantidade e diversidade de informações disponibilizadas na Internet e ainda, sua rápida e contínua expansão sem um gerenciamento centralizado, transforma essa rede em um ambiente "caótico". Com freqüência usuários, buscando uma informação específica, depara-se com páginas muito distantes daquilo que buscavam.

Mas há uma outra maneira de se pensar esse caos: não como um obstáculo a ser transposto, mas como uma forma de acesso à informação que pode apontar caminhos imprevisíveis, mas capazes de responder satisfatoriamente às necessidades do usuário. Assim, o caos informacional torna-se modificador mas não um destruidor do conhecimento, já que torna possível e muitas vezes constante a contraposição de pontos de vista acerca de um determinado assunto pesquisado. Essa possibilidade torna-se claríssima com a Internet. Este ato de percorrer a rede costuma ser chamado de "navegar" pelos usuários. Onde o percurso não está preveamente traçado e as mudanças de direção são constantes mas que não significa que não se tenha um objetivo específico.

Acerca dos fins desse novo meio, não se pode porém, acreditar que esteja traçado. O que se pode afirmar a princípio, é que as mudanças estão presentes desde o surgimento do primeiro componente duma máquina computacional. Não se pode afirmar que o processo de desenvolvimento do espaço virtual esteja sedimentado. Principalmente porque o avanço tecnológico, nesse meio específico, se dá muito rápido com uma constante substituição de equipamentos por outros mais modernos. A performance de novos equipamentos em relação a outros, há pouco substituídos, mostra a rápida defasagem e constante busca pela substituição presente no meio.

Com a linguagem, as modificações acompanham de perto a dos hardware e software, já que a toda hora surge novas possibilidades por conta do desenvolvimento das tecnologias. Como exemplo pode ser citado as vídeo-conferências em tempo real, reuniões pela internet entre pessoas que não se encontram espacialmente próximas. Por esse fato podemos perceber um pouco da importância de ter um estudo sistemático acerca da formação, estruturação e desenvolvimento desse novo meio, o virtual.

 

 

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